Nota Técnica da Sociedade Brasileira de Acústica – PL 5100/2019

Limites para ruído de templos e o impacto na desvalorização imobiliária, na saúde pública, na Política Nacional do Meio Ambiente e no aumento dos custos da construção civil habitacional.

A Sociedade Brasileira de Acústica – SOBRAC, preocupada com a possibilidade de aprovação do PL 5100/2019 pelo Plenário do Senado, e suas consequências à ordem jurídica, social, ambiental e de saúde pública, analisou e comenta:

Art. 1º Esta Lei estabelece limites para emissão sonora resultante das atividades em templos religiosos”.

Sob o título, “Estabelece limites para emissão sonora resultante das atividades em templos religiosos”, o PL 5100/2019, se apresenta como uma LEI DE EXCEÇÃO, uma vez que, na esfera federal, as questões técnicas e os limites de emissões sonoras são definidos por Resoluções do CONAMA, Resoluções do CONTRAN e em Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho.

Considerando ainda que, constitucionalmente, é exclusivo aos municípios as definições sobre o Uso e o Parcelamento do Solo, concessão de autorizações para construções e de alvarás de funcionamento, fixar, em Lei Federal, critérios técnicos adotados pelos municípios, o PL 5100/2019, pela sua natureza, impacta diretamente em matéria de autoridade municipal, há de se questionar sua inconstitucionalidade.

Art. 2º A propagação sonora, no ambiente externo, resultante das atividades realizadas em templos de qualquer crença não poderá ultrapassar, durante o dia, os limites de 85 dB (oitenta e cinco decibéis) na zona industrial, de 80 dB (oitenta decibéis) na zona comercial e de 75 dB (setenta e cinco decibéis) na zona residencial e, durante a noite, de 10 dB (dez decibéis) a menos em cada uma das respectivas áreas”.

No artigo segundo, o PL propõe fixar em Lei Federal limites em decibels que confrontam com o papel regulador do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA, bem como dos demais conselhos de âmbito estadual e municipal que compõem o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA.

A fixação de limites sonoros é, por natureza, uma questão de ordem de saúde pública. Conforme estudo da Organização Mundial de Saúde – OMS, a poluição sonora em áreas urbanas é a 2ª maior causa de perda de anos de vida das populações urbanas, perdendo apenas para a poluição do ar.

Sendo o tráfego um dos principais agentes de ruídos urbanos, o CONTRAN vem assegurando, por força de suas Resoluções, uma política sistemática junto à indústria automotiva, para redução dos ruídos de veículos automotores.

Esse é um exemplo de política federal que aponta um cenário próximo, onde os ruídos urbanos serão menores, exigindo de outras fontes emissoras ações também pela redução de suas emissões. Esse PL aponta uma política inversa.

Na Tabela 01 abaixo apresentamos a expressiva elevação dos níveis sonoros proposto pelo PL, em comparação com a legislação vigente.

“§ 1º Considera-se noite o período compreendido entre as 22 h (vinte e duas horas) e as 6 h (seis horas).
§ 2º Para fins de aferição da emissão sonora, considera-se ambiente externo o local de onde parte a reclamação”.

Os parágrafos primeiro e segundo do art. 2º do PL 5100/2019 se propõe a definir em lei federal uma competência que, hoje, é dada aos municípios, em função dos hábitos de sua população em cada distrito ou região. Alguns municípios fixam o período noturno a partir de 20h, mas a grande maioria adota o intervalo entre 22h de um dia e às 7h do dia seguinte em dias úteis e até às 9 h de domingos e feriados.

Novamente, se aprovado, o PL definirá em lei federal matéria de caráter municipal.

Art. 3º As medições da propagação sonora pelas autoridades ambientais serão acompanhadas por um ou mais representantes indicados pela direção da entidade religiosa onde se fizer a medição.
§ 1º Para a constatação do excesso na emissão sonora, deverão ser feitas 3 (três) medições, com intervalo mínimo de 15 min (quinze minutos) entre elas, e a média aritmética será o número considerado para a conclusão da existência ou não do excesso.
§ 2º O resultado final das medições mencionadas no § 1º deste artigo deverá desconsiderar as emissões sonoras decorrentes de fontes diversas daquelas atribuídas às atividades realizadas em templos religiosos
”.

O art. 3º do PL 5100/2019 propõe estabelecer em Lei Federal disciplina de competência do Poder Executivo Municipal, a quem compete a regulamentação de “COMO” executar as diretrizes legais e infralegais.

Ademais, a emissão sonora de um templo ou igreja, que utiliza de amplificadores de áudio, pode ser imediatamente cessada ou limitada através do controle de volume dos amplificadores de áudio, permitindo assim, que a igreja elimine a poluição sonora no ato da fiscalização.

Novamente os parágrafos primeiro e segundo têm seu conteúdo objeto de Norma Técnica, passível de atualização em função de avanços tecnológicos, portanto, não é recomendado tal conteúdo ser fixado em corpo de lei.

Art. 4º As penalidades disciplinares ou compensatórias bem como as multas ou outras sanções legais somente serão aplicadas em função do não cumprimento das medidas corretivas necessárias impostas pela fiscalização.
§ 1º Para fins do disposto no caput deste artigo, a autoridade ambiental concederá prazo de 90 (noventa) a 180 (cento e oitenta) dias para adoção das providências de adequação sonora, contado da data da autuação ou notificação administrativa.
§ 2º As sanções previstas no art. 14 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, somente serão aplicadas nas hipóteses de reincidência ou na ausência das providências determinadas pela autoridade ambiental para a adequação sonora
”.

O art. 4º também representa conflito com a autoridade municipal, ao fixar requisitos referentes às multas, sansões e o cumprimento de medidas corretivas. No parágrafo 1º o PL fixa prazos mínimo e máximo, novamente confrontando com a autoridade municipal. No parágrafo 2º o PL impõe limitações à aplicação de sanções previstas no art. 14 da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.

Art. 5º Os §§ 1º e 2º do art. 6º da Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981, passam a vigorar com a seguinte redação: “Art. 6º ………………………….. §1º Os Estados, na esfera de suas competências e nas áreas de sua jurisdição, elaborarão normas supletivas e complementares e padrões relacionados com o meio ambiente. § 2º Os Municípios poderão elaborar normas supletivas e complementares para atender às peculiaridades e ao interesse local. ……………………………………….(NR)

O art. 5º, ao excluir a expressão “observados os que forem estabelecidos pelo CONAMA” do parágrafo 1º e ao alterar a redação do § 2º, o PL exclui a obrigação dos Estados e dos Municípios respeitarem os requisitos ambientais fixados pela União, através de Resoluções e decisões do CONAMA.

Se esse PL for aprovado pelo Plenário do Senado, além de se tornar a “Lei do Barulho”, quebrará a “hierarquia das normas”, retirando o poder de aplicação das matérias regulamentadas no âmbito federal pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente e dando maior poder aos Estados e Municípios.

Destacamos que a postura dos parlamentares que defendem o PL em questão não representa a visão da totalidade dos líderes religiosos, pois, há anos, líderes religiosos conscientes vêm adotando controle sonoro, isolamento e tratamento acústico nas edificações, mostrando preocupação e respeito pelas pessoas que estão tanto dentro quanto fora dos templos e preservando, assim, a saúde e o conforto de todos.

Esta preocupação vem de encontro à tendência observada no mercado imobiliário da desvalorização dos imóveis inseridos em ambientes ruidosos, inclusive necessitando de um aumento do custo na construção civil para adequar às edificações com o isolamento acústico necessário, sobretudo em atendimento ao Código de Defesa do Consumidor.

Diante das ponderações apresentadas acima e da gravidade dos desdobramentos que repercutirão caso esse PL seja aprovado pelo Senado, a SOBRAC solicita o apoio dos senhores e das senhoras Senadores e Senadoras para dialogarmos na construção de uma solução saudável e coerente com os avanços e convergências com as políticas públicas.

Santa Maria, 12 de março de 2024.

Krisdany Vinicius S. M. Cavalcante
Presidente
Sociedade Brasileira de Acústica – SOBRAC 40 anos

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